Texto por Guilherme Goes e Fotos por Gustavo Diavok (@xchicanox)
Quem acordou cedo na última quinta-feira (24), ligou sua televisão e passou pelo canal da Rede Globo durante a exibição do telejornal “Bom Dia, São Paulo” pode ter se deparado com uma entrevista interessante filmada na Galeria Nova Barão, popularmente conhecida como “Galeria dos Discos”. O entrevistado era uma figura com uma biografia única, nascido em Massachusetts e criado em Oakland, Califórnia, foi o oitavo entre quinze irmãos e enfrentou uma juventude difícil, marcada por desafios e vivências no crime.
Trata-se de Xavier Amin Dphrepaulezz, mais conhecido como Fantastic Negrito, vencedor do Grammy na categoria Blues em 2016, cuja obra mistura influências que variam de Prince, Radiohead a Tim Maia. Naquela mesma noite, ele se apresentaria no Cine Joia, uma conhecida casa de shows localizada no bairro da Liberdade, na região central de São Paulo, marcando sua terceira passagem pela metrópole.

Apesar da visibilidade proporcionada pela excelente reportagem (que chamava atenção por transmitir uma “atmosfera underground” em um trabalho produzido para um canal mainstream) e da popularidade crescente de Negrito, impulsionada pela originalidade de seu trabalho, o evento não alcançou lotação máxima. Parte disso se deve ao grande número de shows marcados em São Paulo nestes últimos dias de outubro, gerando uma concorrência acirrada. Além disso, a organização do horário deixou a desejar: a casa abriu às 19h, o primeiro show começou apenas às 21h10, e a atração principal subiu ao palco perto das 23h, dificultando a presença de quem precisava acordar cedo para o trabalho no dia seguinte.

Para aquecer o público, os sets de Thiago DJ (conhecido pelo trabalho na 89 FM) e DJ Arakake trouxeram uma seleção variada de rock, rap, indie e reggae, criando uma atmosfera eclética e animada.
A festa também contou com duas bandas de abertura. A primeira a subir ao palco foi NAIMACULADA, grupo de rock experimental formado em São Paulo e vencedor do concurso #tododiaumrock, que tem Pietro Benedan, filho de João Gordo (Ratos de Porão) na bateria. O som da banda se destacou pela fusão de saxofone e guitarras em ritmo indie rock, acompanhada por uma bateria intensa e enérgica. A maior parte das músicas apresentadas fazia parte de um álbum que o grupo pretende lançar em março de 2025. Um dos destaques do set foi a canção “Árvores”, uma faixa com bases indie em conjunto com explosões noise caóticas, cuja composição protesta contra a falta de arborização em Osasco – a segunda cidade menos arborizada do estado de São Paulo.

Em seguida, foi a vez da Steel Band, grupo que se apresenta regularmente aos domingos na casa de espetáculos Steel Bar, em Moema, e que decidiu expandir seu alcance para novos públicos. Com uma sonoridade mais alinhada ao estilo da atração principal, a banda mistura blues com rock clássico. Em um set de seis músicas, o grupo mostrou grande profissionalismo, destacando-se por passagens extensas de teclado e linhas de baixo animadas, feitas para levar a pista a dançar.
Após um atraso de 20 minutos devido a uma falha técnica (o que prejudicou ainda mais o público que dependia de transporte público para voltar para casa), os músicos de apoio de Fantastic Negrito subiram ao palco e abriram o show com uma introdução instrumental. Logo em seguida, a estrela da noite surgiu e iniciou o set com “Runaway From You”. Houve problemas no microfone, mas isso não diminuiu seu entusiasmo: ele cativou a plateia dançando de ponta a ponta no palco. Em seguida, pegou a guitarra e apresentou “Working Poor,” uma faixa com ritmo dançante e linhas de baixo recheadas por técnicas slaps.

Se a dobradinha inicial trouxe um “rock/blues” curioso, que lembrava levemente The Black Keys, “Bad Guy Necessity” contou com uma guitarra mais cadenciada e ritmo lento. Negrito fez uma mudança precisa na letra, berrando “São Paulo” ao invés de um dos trechos originais. Em contraste, “I’m So Happy I Cry” devolveu a energia com uma bateria marcada por viradas intensas. Em “Oh Betty”, faixa de influência pop com um toque de OutKast dos anos 2000 e uma pitada de blues, Negrito puxou um coro de “Yeah Yeah” que a plateia acompanhou com entusiasmo.
No meio do show, Negrito fez uma breve pausa e voltou ao palco com uma roupa extravagante, composta por uma espécie de capa dourada. Assim, seguiu com “I Hope Somebody’s Loving You”, uma canção lenta e romântica que revelou seu talento no teclado. Mantendo-se direto ao ponto, ele seguiu com uma sequência de músicas sem diálogos longos, e as esperadas “An Honest Man”, “Son of a Broken Man,” “In The Pines,” e “California Loner” foram recebidas com grande entusiasmo pelo público.
Infelizmente, o horário não colaborou, e alguns problemas de som comprometeram a experiência em certos momentos. Ainda assim, o público paulistano pôde vivenciar a energia envolvente de Fantastic Negrito. O músico entrega-se totalmente a cada canção, enquanto sua banda esbanja criatividade, adicionando elementos únicos em cada performance. Sem dúvida, uma figura formidável que merece o reconhecimento global, ainda que o sucesso tenha chegado tardiamente.
Setlist
– Runaway From You
– Working Poor
– Bad Guy Necessity
– I’m So Happy I Cry
– Oh Betty
– I Hope Somebody’s Loving You
– Chocolate Samurai
– Scary Woman
– An Honest Man
– Drifting Away
– Crooked Road
– Son of a Broken Man
– Bullshit Anthem / Night Has Turned to Day
– Rant Rushmore
– Devil In My Pocket
– Skirty
– In the Pines
– California Loner
– Plastic Hamburgers / A Long Long Road
– The Duffler
Bis
– Lost in a Crowd