Up Front Festival: punk de todas as vertentes, energia de sobra e uma despedida amarga

No último domingo de Dia das Mães, o Carioca Club, em São Paulo, foi tomado por coturnos, moicanos, camisetas pretas e muita atitude. O motivo? A realização do Up Front Festival, evento que reuniu seis bandas de diferentes vertentes do punk rock – do hardcore político ao street punk inglês – e que tinha como ponto alto o show de despedida da lendária banda escocesa The Exploited em solo brasileiro.

Fotos por Raíssa Corrêa

Pontualidade britânica em pleno Brasil? Sim! Às 15h em ponto, como prometido, o festival começou com a apresentação enérgica do Punho de Mahin, quarteto paulistano que vem conquistando espaço no underground nacional e que recentemente assinou com a gravadora Deck. Com vocais poderosos de Natália Matos e uma performance intensa, a banda abriu os trabalhos com competência e mostrou porque é uma das apostas do cenário punk atual.

Logo em seguida, foi a vez do Escalpo tomar o palco. A banda, formada por veteranos da cena paulistana – alguns morando no exterior –, trouxe um metal punk cru e barulhento, que incendiou o público com faixas como “Escravidão Auto Imposta” e “Olhando para o Chão”. A entrega foi total, com direito a momentos catárticos entre os membros no palco. Uma apresentação visceral, que mesmo sem reinventar a roda, fez barulho no melhor sentido possível.

Se havia uma pequena ressalva nos primeiros shows, era o volume do som, que parecia um pouco abaixo do ideal. Talvez impressão, mas com certeza um ganho de decibéis teria ampliado a potência dessas performances iniciais.

A “segunda parte” do festival foi aberta pelos ingleses do The Chisel, uma das sensações do punk europeu atual. A banda londrina, que mistura Oi!, street punk e hardcore, fez um show direto e eletrizante, com Callum Graham liderando uma roda punk feroz. Hits como “Come See Me”, “Class Oppression” e “Evil by Evil” foram recebidos com entusiasmo crescente pela plateia, que já lotava a casa. Callum, visivelmente animado por estar no Brasil, não parava de interagir com o público, mesmo com o forte sotaque cockney dificultando a comunicação. Mas, no espírito punk, isso só tornou o show mais divertido e autêntico.

Às 18h30, foi a vez do Ratos de Porão subir ao palco. A casa estava lotada, e a banda paulista, liderada por João Gordo, fez o que sabe fazer de melhor: um show destruidor. O setlist foi uma pancadaria sonora com clássicos como “Crucificados pelo Sistema”, “Beber Até Morrer” e “Juventude Perdida”, além de faixas mais recentes como “Alerta Antifascista”. Gordo não poupou críticas ao ex-presidente inelegível, e o público respondeu em uníssono com gritos de “sem anistia”. A energia da banda – com Jão, Juninho e Boka completando o time – foi contagiante. O som agora estava ajustado e potente, criando um paredão sonoro digno de lenda.

Porém, a grande expectativa da noite estava reservada para o último show: The Exploited, em sua última apresentação no Brasil. Mas o que era para ser um encerramento apoteótico acabou se transformando em uma mistura agridoce de homenagem, respeito e frustração. Antes do horário marcado, os três integrantes da banda apareceram no palco passando o som, com as cortinas abertas – já um indicativo de que algo não estava como o planejado. Às 20h em ponto, a confirmação: Wattie Buchan, vocalista e único membro original, não subiria ao palco por motivos de saúde. Um vídeo foi exibido no telão, com Wattie visivelmente abatido, explicando que estava com pneumonia e que se apresentar naquela noite poderia ser fatal.

A notícia caiu como um balde de água fria no público, que acompanhava os rumores desde o cancelamento do show em Belo Horizonte. Mesmo assim, o restante da banda – Irish Rob, G-Man Sullivan e Steve Campbell – decidiu seguir com o show, transformando o momento em uma homenagem a Wattie. Callum Graham e João Gordo voltaram ao palco para dar suporte nos vocais, e, mesmo com o clima pesado, o público respondeu com respeito e apoio.

Apesar do set reduzido, músicas como “Fight Back”, “Dogs of War”, “Beat the Bastards” e “Sex and Violence” (com participação de fãs subindo ao palco e Jão na guitarra) mantiveram o espírito punk aceso até o fim. Irish Rob, com carisma e gratidão, segurou as pontas nos vocais e emocionou ao dizer que “Why Do You Do This to Me” também falava sobre saúde – uma clara alusão à situação de Wattie.

No fim, ficou aquele gosto amargo: a ausência de uma lenda no palco, a preocupação com sua saúde e a sensação de despedida incompleta. Mas também ficou evidente a força da comunidade punk – bandas, público, produção – que soube transformar um revés em um momento de união e resistência.

O Up Front Festival foi, acima de tudo, uma celebração do espírito punk: autêntico, barulhento, coletivo e resiliente. E mesmo sem Wattie, o legado do The Exploited foi honrado. Porque, como bem disse o baixista Irish Rob, punks not dead… but sometimes they get sick.

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