Judas Priest e Queensrÿche celebram o metal em sua mais alta performance no Vibra São Paulo.

Depois de mais de dez anos longe dos palcos brasileiros, o Queensrÿche voltou com tudo para mostrar que o tempo passou, mas a essência permanece intacta — ou até mais afiada. Já o Judas Priest, com quase seis décadas de estrada, provou que ainda reina absoluto, equilibrando clássicos e novidades com uma energia de fazer inveja a bandas bem mais jovens — Rob Halford foi simplesmente colossal.

Fotos por Gabriel Gonçalves

Queensrÿche retorna ao Brasil após mais de uma década e emociona com set poderoso (e ousado)

Todd La Torre, à frente dos vocais desde 2012, mostrou por que é considerado um substituto à altura do lendário Geoff Tate. Com impressionante naturalidade, ele desfilou por clássicos como “I Don’t Believe in Love”, “Warning” e “The Lady Wore Black” sem deixar espaço para qualquer sombra de dúvida — ou saudade. Sua presença de palco é marcante, e sua voz atinge os agudos com precisão cirúrgica. O timbre? Um tributo vivo à era clássica da banda, sem soar forçado.

Na intensa “Walk in the Shadows”, o baixo de Eddie Jackson estava estralando, dando ainda mais peso à execução. Durante a música, La Torre interagiu com o público, perguntou quem estava vendo a banda pela primeira vez e arrancou sorrisos e gritos com sua simpatia e carisma.

E se emoção era o que os fãs queriam, eles tiveram de sobra. Em “Take Hold of the Flame”, a balada que faz qualquer roqueiro veterano querer erguer os braços e cantar com os olhos fechados, foi impossível não se arrepiar. Agudo no talo, coro do público a plenos pulmões — um dos pontos altos da noite. 

Mas também teve ousadia: as duas músicas mais populares da banda nas plataformas digitais, “Silent Lucidity” e “Jet City Woman”, ambas do clássico Empire (1990), simplesmente ficaram de fora. A primeira, maior hit da carreira do grupo e figurinha carimbada nas rádios roqueiras dos anos 1990, foi ignorada por completo. A segunda também foi limada, mesmo sendo a vice-líder de streams no Spotify. O álbum Empire, aliás, foi representado apenas por sua faixa-título — que contou com a apresentação da banda no meio da música, acompanhada por palmas e gritos do público.

Faz sentido? Em parte, sim. A turnê atual celebra os primórdios do Queensrÿche, com foco no EP homônimo de 1983 e no álbum de estreia The Warning (1984). Das doze músicas tocadas, quatro vieram desses dois trabalhos. Já o seminal Operation: Mindcrime (1988) apareceu com cinco faixas, incluindo “The Needle Lies” (um verdadeiro arregaço ao vivo) e o encerramento apoteótico com “Eyes of a Stranger”, onde La Torre registrou a plateia com seu celular enquanto cantava — um gesto simples, mas que reforçou a conexão entre artista e público.

O show teve ainda “Queen of the Reich”, “Screaming in Digital”, “Breaking the Silence” e outras pérolas de um repertório que privilegia o lado mais progressivo e visceral da banda. A ausência dos hits radiofônicos pode ter deixado alguns fãs frustrados, mas é inegável que a entrega em palco compensou qualquer ausência.

No fim das contas, o Queensrÿche provou que não precisa se apoiar apenas no passado comercial para emocionar. A performance foi uma aula de técnica, paixão e respeito à própria trajetória. Para quem esperou mais de uma década para vê-los ao vivo, foi mais do que um show — foi um reencontro com a alma do metal progressivo.

Judas Priest: Quase 60 anos de estrada e ainda são os deuses do metal 

Para os deuses do metal, não basta alcançar 55, quase 60 anos de carreira — é preciso fazê-lo em um nível de qualidade surpreendente. Em 2025, o Judas Priest mostrou ao mundo que continua sendo uma força imbatível do heavy metal, e o show realizado no Vibra São Paulo, em São Paulo, foi a prova viva disso.

Impossível não começar falando de Rob Halford. Aos 73 anos, o vocalista justifica a cada apresentação o apelido de “Metal God”. Com fôlego impressionante para sua idade — e para qualquer idade, diga-se —, ele encara músicas desafiadoras como quem ainda tem décadas pela frente. Ninguém esperaria que soasse exatamente como nos anos 80, mas o que entrega hoje é mais que suficiente para deixar qualquer fã de queixo caído.

A formação atual está afiadíssima. Os “novatos” Richie Faulkner (45) e Andy Sneap (55) dividem as guitarras com técnica e presença. Richie, que assumiu o posto de K.K. Downing em 2010, é hoje um dos pilares do som ao vivo da banda, e parece não ter sido abalado pelos graves problemas de saúde que enfrentou nos últimos anos — incluindo um aneurisma no palco e uma sequência de AVCs. Andy Sneap, produtor renomado que se juntou à banda em 2018, também tem mostrado cada vez mais conforto e desenvoltura no palco, com solos precisos e uma entrega segura.

Mesmo com expectativas de homenagens ao clássico Painkiller (1990) — que completa 35 anos em 2025 —, o Judas optou por focar na turnê do novo álbum Invincible Shield (2024). Nada de saudosismo forçado: eles estão olhando para frente, sem esquecer de onde vieram. A abertura com “Panic Attack” deu o tom do show: rápida, intensa e perfeita para começar com o pé no acelerador. 

“Painkiller”, por exemplo, segue firme no setlist, exigente como sempre, com uma performance vocal que arranca aplausos sinceros. Outros momentos intensos, como “Devil’s Child”, “Riding on the Wind” e o agudo arrebatador de “Victim of Changes”, deixam claro que Halford não se esconde atrás de versões mais leves ou truques de palco — ele encara tudo de peito aberto. A homenagem a Glenn Tipton, guitarrista afastado por conta do Parkinson, também trouxe emoção ao telão pouco antes da execução dessa última.

A sequência foi matadora: “You’ve Got Another Thing Comin” botou o público para cantar em coro, enquanto a veloz “Rapid Fire” manteve o ritmo lá em cima. Quando chegou a vez de “Breaking the Law”, o Vibra São Paulo veio abaixo — impossível não cantar junto ou bater cabeça.

“Riding on the Wind” mostrou por que tanta gente se apaixonou pelo heavy metal: refrão marcante, solos afiados e riffs que grudam na cabeça. Durante “Love Bites”, imagens do clássico filme Nosferatu (1930) passaram no telão, criando um clima sombrio que combinou perfeitamente com o peso da faixa. “Devil’s Child” e “Saints in Hell” mantiveram o nível, com riffs poderosos e refrões de levantar defunto.

Um dos grandes destaques foi “Crown of Horns”, do novo álbum, que soou ainda mais melódica e emocional ao vivo. A escolha da banda em incluí-la no setlist foi certeira. Logo em seguida, “Sinner” incendiou o palco — literalmente — com projeções de chamas no telão e um solo de guitarra arrebatador.

Quando “Turbo Lover” começou, o público explodiu. Apesar de ser de uma fase menos celebrada da banda, a faixa é um hino em si, com seu refrão grudento e clima de semi-balada. Ninguém ficou parado.

Halford interagiu bastante, agradecendo a São Paulo com carinho e anunciou a poderosa “Invincible Shield”, faixa-título do novo álbum, que parece ter sido feita sob medida para o palco — riff cavalar, refrão marcante e uma bateria devastadora.

Mas foi em “Victim of Changes” que Halford brilhou de forma quase sobrenatural. Seu vocal agudo, poderoso e limpo, surpreendeu até os fãs mais antigos, que acompanharam tudo com palmas e olhos arregalados.

Antes de anunciar “Painkiller”, o baterista Scott Travis tomou o microfone e agradeceu ao público, anunciando que aquele era o último show da turnê no Brasil. O que veio a seguir foi um massacre sonoro: “Painkiller” ao vivo continua sendo uma das experiências mais brutais e emocionantes que o metal pode oferecer. O homem com 63 anos é uma máquina. Criador da lendária linha de “Painkiller”, ele pode até estar sentado, mas transmite uma energia juvenil e mantém o andamento das músicas com precisão quase mecânica — no bom sentido. 

O encore começou com “The Hellion / Electric Eye”, com a plateia participando intensamente, seguida por “Hell Bent for Leather”, com a icônica entrada de Halford em sua Harley-Davidson. Impossível não se arrepiar com esse momento. Para encerrar, “Living After Midnight” botou todo mundo pra cima, cantando e pulando como se o show tivesse acabado de começar.

O Judas Priest não apenas sobrevive — eles reinam. Mostram ao mundo que é possível envelhecer com dignidade no palco do heavy metal, sem abrir mão da energia, da entrega e, acima de tudo, da paixão pela música. Em São Paulo, eles provaram que a idade é apenas um número, e que a coroa do metal ainda repousa em sua cabeça com todo merecimento. 

Setlist Queensrÿche – Vibra São Paulo – 20/04/2025

Queen of the Reich

  1. Operation: Mindcrime
  2. Walk in the Shadows
  3. Breaking the Silence
  4. I Don’t Believe in Love
  5. Warning
  6. The Lady Wore Black
  7. The Needle Lies
  8. Take Hold of the Flame
  9. Empire
  10. Screaming in Digital
  11. Eyes of a Stranger

Setlist Judas Priest: Judas Priest: Invincible Shield World Tour 2025Vibra São Paulo – 20/04/2025

Panic Attack

  1. You’ve Got Another Thing Comin’
  2. Rapid Fire
  3. Breaking the Law
  4. Riding on the Wind
  5. Love Bites
  6. Devil’s Child
  7. Saints in Hell
  8. Crown of Horns
  9. Sinner
  10. Turbo Lover
  11. Invincible Shield
  12. Victim of Changes
  13. The Green Manalishi (With the Two Prong Crown) (Fleetwood Mac cover)
  14. Painkiller 
  15. The Hellion / Electric Eye
  16. Hell Bent for Leather
  17. Living After Midnight
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