Ira! celebra os 20 anos do lançamento do icônico álbum “Acústico MTV” -

Com duas datas de casa cheia, o Ira! esteve em São Paulo no último fim de semana para duas apresentações dessa turnê especial.

Fotos por Natalia Eidt

Celebrando os 20 anos do lendário álbum Acústico MTV, o Ira! subiu ao palco do Vibra São Paulo para duas apresentações memoráveis. Na sexta-feira (9), a banda entregou um show eletrizante, com a casa cheia e o público ocupando cada espaço da pista e das poltronas. Já no sábado (10), com ingressos esgotados, o grupo optou por um formato mais intimista, em uma performance especial com mesas, criando um clima acolhedor e nostálgico.

Após algumas polêmicas recentes envolvendo a banda, o Ira! conseguiu fazer uma apresentação tranquila e sem confusão. Tudo porque, em abril, em um show em Contagem (MG), o vocalista Nasi gritou “Sem anistia”, como forma de protesto em relação aos atos de 8 de janeiro de 2023. Ele recebeu aplausos de parte do público, mas também algumas vaias. Às vaias, Nasi respondeu de forma direta, causando grande repercussão na internet.

Dias depois do ocorrido, quatro shows foram cancelados nas cidades de Jaraguá do Sul (SC), Blumenau (SC), Caxias do Sul (RS) e Pelotas (RS). Os cancelamentos, segundo a produtora, foram resultados do abandono de patrocinadores e devolução de ingressos. Em vídeo recente, Nasi pede desculpas e esclarece detalhes de como foram os acontecimentos do show em Contagem e tranquiliza os fãs dizendo que a agenda de shows e ensaios continuam normalmente. E foi exatamente o que se viu no último fim de semana.

O show, que estava previsto para começar às 22h, teve um atraso de quase 30 minutos. Apesar de ser uma noite de sexta-feira, alguns fãs precisaram deixar o show antes mesmo do encerramento – que ocorreu às 00:05, devido à dependência do transporte público.

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Além de Nasi nos vocais, sobem ao palco com a poderosa “Pra ficar comigo” Edgard Scandurra (violão e guitarra), Johnny Boy (teclados), Evaristo Pádua (bateria), Daniel Scandurra (baixo e violão), Jonas Moncaio (violoncelo e flauta) e Juba Carvalho (percussão). E que começo! Apesar da espera e da ansiedade que tomavam conta do público nos momentos antes do início do show, a energia na casa era contagiante. Bastaram os primeiros acordes para deixar claro que a noite seria inesquecível.

Com “O Girassol” já na sequência, não deu nem tempo de respirar. Clássico absoluto da banda, a canção emocionou o público e ganhou um refrão estendido, com Nasi conduzindo um verdadeiro coral. É uma música que carrega ritmo, letra marcante e muita história.

Já em “Flerte Fatal” — composição de Edgard Scandurra, lançada originalmente em 2003 em seu disco solo Benzina Dream Pop e incorporada mais tarde ao Acústico MTV: Ira! — ficou evidente o que todos já sabem: a impressionante qualidade técnica de Scandurra como músico e compositor. Ao violão, ele protagonizou um verdadeiro espetáculo à parte.

Em dias “Dias de Luta”, parte do público tenta, em forma de protesto e apoio ao Nasi, fazer o mesmo que ocorreu no mês passado no show de Contagem (MG), puxar o coro de “Sem anistia”. O vocalista desconversa tirando o foco desse tema e prioriza agradecer pelo público que está presente e anuncia a próxima música dizendo que é uma dos primórdios do Ira!.

Ao anunciar “Saída” em vez de “Tarde Vazia”, os fãs mais atentos perceberam que a ordem das músicas naquela noite seguiria a sequência da gravação do DVD, e não a do CD, onde “Saída” é a última faixa.

Em “15 Anos”, com um tom de nostalgia e reflexão sobre os acontecimentos recentes, Nasi declara que segue “vivendo e não aprendendo”, como diz um dos versos mais marcantes da canção, e acrescenta: “Que sirva também para reflexões futuras”. A música, composta por Edgard Scandurra e Ricardo Gasparini — ex-baixista da banda —, ganha uma menção especial, com Nasi agradecendo publicamente a contribuição de Gaspa. Em seguida, ele comenta brevemente sobre o projeto Acústico MTV: Ira!, realizado em 2004, relembra os músicos que participaram da gravação do DVD e anuncia a próxima faixa da noite: “Rubro Zorro”. De maneira sutil, em meio à canção, o vocalista solta a frase: “Hoje, contra a anistia”. A declaração provoca uma reação imediata e entusiasmada — parte do público vai ao delírio.

Escolhida como tema de abertura da novela O Outro, da Rede Globo, em 1987, “Flores em Você” ganhou grande notoriedade e rapidamente se tornou uma das músicas mais tocadas nas rádios brasileiras naquele ano. O sucesso foi tão expressivo que surpreendeu até a própria banda — No show, Nasi revelou que, até então, a canção estava praticamente “esquecida” por eles. Além disso, o violoncelista Jonas Moncaio foi apresentado por Nasi e calorosamente aplaudido pela plateia. Um dos destaques da noite, Moncaio encantou o público não apenas com o violoncelo, mas também ao se apresentar com uma flauta, demonstrando versatilidade e sensibilidade musical.

“Muito Além”, composição de Edgard Scandurra em parceria com Arnaldo Antunes, foi lançada no projeto Acústico MTV: Ira!. Ao anunciar a canção, Nasi faz questão de prestar uma homenagem pedindo reverência a Arnaldo Antunes e destacando o orgulho de tê-lo como parte da história musical. Embora não tenha sido incluída na versão em CD do álbum, a faixa está presente no DVD e nas apresentações ao vivo.

Em “Tanto Quanto Eu”, Scandurra apresenta a banda e, ao explorar brevemente cada instrumento, os músicos, mais uma vez, demonstram a sua impressionante qualidade técnica. Um destaque especial vai para o tecladista Johnny Boy, que, com sua habilidade no ritmo e velocidade, transforma o Vibra São Paulo em uma verdadeira pista de dança, trazendo à tona as influências marcantes dos anos 80.

“Envelheço na Cidade” foi um dos momentos mais vibrantes e nostálgicos da noite, unindo público e banda em uma verdadeira celebração. A canção, que carrega o peso emocional do tempo e da vida urbana, se transformou em pura energia ao vivo. Enquanto a plateia cantava cada verso com entusiasmo, pulava e registrava tudo com seus celulares, Edgard Scandurra entregava um solo de guitarra marcante — técnico, visceral e ao mesmo tempo carregado de emoção.

Para encerrar a apresentação do álbum na íntegra, o Ira! performa “Núcleo Base”, cantada em coro pelo público. Os versos “Meu amor, eu sinto muito, mas vou indo, pois é tarde, é muito tarde, eu preciso ir embora” soam como uma despedida perfeita para a noite. Já “Eu tentei fugir, não queria me alistar, eu quero lutar, mas não com essa farda!” provoca uma explosão de vozes, em um canto que mistura emoção e protesto, algo que já vimos ser bastante característico nos shows do Ira!.

Mas este ainda não era fim, a banda retorna ao palco para um encore com mais três canções: “Mudança de Comportamento”, “Chuto Pedras e Assobio” e, encerrando a noite, “Bebendo Vinho” — uma releitura da música composta por Wander Wildner, lançada originalmente em 1994.

Ao final de tudo, ficou claro que o Ira! segue mais vivo do que nunca — não apenas como uma banda que marcou gerações, mas como um símbolo de resistência, reinvenção e paixão pelo palco. Celebrando o passado sem perder o olhar para o presente, o grupo mostrou que a força do rock nacional está, sim, na memória, mas também pulsa no agora. Um show que foi muito mais do que música: foi encontro, catarse e celebração.