Thiago “YØg” Ribeiro fala sobre a inspiração da banda com seu mais recente álbum “Antithesis, e como se inspirou em obras literárias e cinematográficas para moldar o álbum, com temas que vão desde o pós-apocalipse até críticas à institucionalização religiosa.
1. “Antithesis” explora diversos temas literários e cinematográficos. Como foi o processo de escolher essas influências, e de que maneira elas moldaram a identidade do álbum?
Thiago R.: esse disco [Antithesis] foi resultado de uma coleção de bate-papos e conferências entre eu e o [Andre] Martins, pouco antes, e ao longo do período da pandemia (COVID-19). Há décadas partilhamos de comum interesse por peças que abordem a humanidade em situação de pós-apocalipse, e acabamos que por trocar notas sobre filmes, séries, livros, e quadrinhos, deixando na peneira apenas os que tratavam de temas dissonantes em si, e/ou entre si. “Antithesis” é composto de Ideias em colisão e oposição de um ou mais ângulos
Porém, como em todos os nossos trabalhos anteriores, há faixas deviantes desse nicho, abordando temas mais introspectivos, como a perda do Poli, críticas severas à armificação / milicialização de instituições religiosas .
2. A faixa “Last Thread of Hope” traz uma forte influência do metalcore e do filme “Inimigo Meu”. Como vocês equilibram a inspiração de diferentes gêneros e mídias na criação das suas músicas?**
Thiago R.: o “Inimigo Meu” é um clássico pelo qual eu e o [André] Martins temos muito carinho. Por mais que os efeitos especiais não sejam primorosos, o texto é muitíssimo bem escrito, e a história em si é muito bonita, e conta com desfecho bem “pra cima”, contrastando com o usual final terrível que encontramos na maioria das distopias futurísticas que nos agrada.
3. Em “S.T.A.Y”, a influência de “Interestelar” é clara na narrativa da letra. Como foi o processo de dividir a história do filme em quatro cenas musicais, e qual foi o maior desafio de transformar esse épico cinematográfico em uma música?**
Thiago R.: a “S.T.A.Y.” foi o maior desafio do disco pra mim, tanto como letrista, quanto como vocalista. A seleção das cenas a serem escolhidas, e o entrelaçar tudo da forma mais “cinematográfica” possível na música demandaram bastante tempo, e muita reescrita. Eu e o Martins vimos o filme ao menos uma dúzia de vezes, e batemos muito papo sobre os cernes da discussão, e a partir de certo ponto, as escolhas foram acontecendo de forma mais natural, e o resultado final nos deixou muito felizes e orgulhosos. É definitvamente uma das canções mais importantes que ja ajudei a escrever na vida.
4. “Condemned to Unexist” traz uma reflexão sobre o clássico “1984”. Como vocês conciliam o aspecto distópico da obra com a abordagem pessoal e criativa da banda?
Thiago R.: como comentei em outra pergunta, futuros distópicos sempre nos fascinaram. À época de escolha dos temas, a discussão sobre totalitarismo e controle institucional parecia interessante. Tentei ler o livro mais de uma vez, mas não consegui avançar pela escrita maçante e auto-indulgente, além de, a posteriori, saber mais sobre o viés anticomunista que cerca toda a vida e obra da figura lastimável de George Orwell. Todavia, dado que o avanço da produção, e nossos prazos já em momento limítrofe, foi decidido que o tema não mudaria, e que eu faria uma abordagem 100% literal da história, como fiz em inúmeras outras canções, e o resultado satisfez a todos nós, resultando em uma canção inegavelmente memorável.
5. Vocês mencionam que a faixa “Where the Grasshopper Lies” foi escolhida pelos fãs. Como é o processo de envolvimento do público nas decisões criativas da banda? Esse tipo de interação influencia outras partes da produção?
Thiago R.: Foi a primeira vez que tivemos esse tipo de interação com nossos fãs e amigos, e o processo foi muito massa! Muitas pessoas mandaram mensagens, falando sobre as obras e os motivos de suas escolhas. Toda essa troca foi muito gratificante, e estreitou laços com quem acompanha e gosta do trabalho da Hatematter. Eu e o Martins ja havíamos abordado uma obra do mestre Phillip K. Dick (Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?), e foi um grande prazer visitar mais essa pancada que é o Homem do Castelo Alto. No mais, na produção em si, seguimos normalmente, e foi um prazer ler o livro que é seminal para o genêro conhecido hoje como “What If?…”, explorando linhas do tempo alternativas a partir de momentos históricos de proporções cataclísmicas.
6. **”Liberate Me” contou com a colaboração de Mayara Puertas. Como foi trabalhar com ela, e de que maneira sua participação trouxe uma nova dimensão à música?
Thiago R.: a participação da Mayara foi, antes de tudo, uma honra pra todos nós. A presença dela mudou toda a dinamica de vozes, e as linhas que ela criou, literalmente na hora da gravina, engrandeceram e muito a música como um todo. Toda a ideia dela assumir a identidade da nave (Event Horizon), em suas diversas faces, foi uma sacada brilhante! O resultado final ficou muito acima do que originalmente havíamos imaginado, e é uma canção muito querida por nós, por explorar novos territórios sonoros.
7. A perda de Gustavo Polidori teve um impacto profundo na banda, refletido em faixas como “All Blind Eyes Turned” e “In the Silent Still”. Como vocês transformaram esse luto pessoal em inspiração criativa?
Thiago R.: “All Blind Eyes Turned” nasceu de um riff do Poli, e construímos a cancão a partir daí, creditando ele como compositor principal. No mais, o tema da música é uma crítica pessoal minha às instituições evangélicas que abertamente exploram a fé e vulnerabilidade do nosso povo em benefício próprio. O Poli era muito vocal sobre isso, e apoiava tal crítica veementemente, condenando essa prática imunda e desumanizante.
Em “In the Silent Still”, dei meu adeus final à ele, visto que na época do seu falecimento, por conta das restrições e do pavor da pandemia, não pude estar presente em seus momentos finais. Desde então, vinha esboçando versos que me ajudassem a lidar com o peso dessa perda irreparável, e tais versos culminaram na canção que encerra o disco.
8. A sonoridade de “Antithesis” tem uma clara evolução em relação aos álbuns anteriores. Com a nova formação, incluindo André Kim na bateria e Thiago Ribeiro na guitarra e vocais, como essas mudanças impactaram a química musical da banda?
Thiago R.: o baterista que gravou o Antithesis foi Marcus Dotta (Warrel Dane / Metalium), e ele partiu para novos projetos logo após a gravina. Minha entrada na banda, agora como músico de fato, foi uma decisão tomada ao longo do período pandêmico. Por já estar envolvido no núcleo criativo desde o “Foundation” (2014/2015), tal decisão pareceu a mais natural a ser tomada, e aceitei o convite com muita trepidação, dado o talento e musicalidade ímpar do Poli, algo que eu jamais poderia sonhar em replicar. O [Andre] Kim se juntou a nós pouco depois da finalização da mix/master do disco, e desde então só agregou à banda, com sua energia explosiva nas baquetas. Estamos muito animados para ver essa química em ação na produção do nosso próximo trabalho.
9.Vocês abordaram temas de ficção científica em álbuns anteriores, como “Foundation”. Existe algum plano de continuar explorando a literatura ou outras obras culturais no futuro?
Thiago R.: O tema ainda se faz presente em “Antithesis”, como em “Last Thread of Hope” e “Liberate Me”, porém não se faz dominante como aconteceu no “Foundation” e no “Metaphor”. Ainda não batemos martelo sobre temas a abordar em trabalhos futuros, mas a ficção científica, em suas mais variadas formas, dificilmente vai sair dos possíveis temas a abordar.
10. Com o lançamento de “Antithesis”, quais são os próximos passos da Hatematter? Já estão trabalhando em novos projetos ou o foco principal é a divulgação do álbum?
Thiago R.: por hora, todos na banda estão bastante atarefados com o dia-a-dia, dado que todos nós temos empregos “normais”, e levamos as tarefas da banda no tempo livre. Estamos divulgando o “Antithesis”, pretendemos fazer mais shows no primeiro trimestre de 2025, e dar início a uma nova produção ainda ainda no ano que vem.