Noite para nenhum fã de New Order e Joy Division botar defeito!
Texto por Vagner Mastropaulo e Fotos por Leca Suzuki
A mais recente passagem de Peter Hook por São Paulo havia sido pré-pandêmica, na mesma Audio e em formato relativamente similar ao do show desta resenha no quesito número de músicas: trinta e duas no total desta vez e uma adicional em outubro/18. No Cine Joia em dezembro/16, ele também havia dividido o repertório entre New Order e Joy Division e as idas à Clash Club em outubro/14 e ao citado Cine Jóia doze meses antes seguiram perto dos mesmos moldes. Apenas a estréia em duas noites consecutivas no Estúdio Emme em junho/11 haviam sido curtas.
Este escriba jamais tinha visto o lendário baixista e, conversando com fontes fidedignas do meio das coberturas, apuramos que nenhum destes eventos dera sold out, embora ele tenha enchido a Audio em 2018. De diferente agora, a divulgação de ingressos esgotados há uma semana do show, provavelmente em razão da uma promessa feita no perfil do músico no Facebook [https://www.facebook.com/peterhookandthelight/posts/925261172301492] em janeiro garantindo, em livre tradução nossa: “Esta será nossa única data na América do Sul neste ano. Vamos tocar ambos os álbuns Substance do Joy Division e do New Order ao vivo e na íntegra, além de outras faixas extras também”.
Sem banda de abertura, o compromisso foi honrado de 22:01 em diante, com um insignificante minuto de atraso em relação ao horário programado, e um anúncio de rápidas palavras feito por um membro de sua equipe: “Senhoras e senhores, Peter Hook & The Light”. Em retribuição, foi sucinto: “Boa noite! Aí vamos nós!”, para o dedilhado inicial de Dreams Never End, única do début Movement (81) no set, já despertar imensa comoção. Procession tirou o público para dançar e, em pé no fundão da pista, o incômodo enfrentado por este repórter devido à lotação era o passa-passa incessante dos retardatários, entrando em cima da hora e querendo lugar na janelinha…
Após Cries And Whispers, Mr. Hook cravou: “What Do You Want From Me?”, causando burburinho com a faixa de seus tempos de Monaco, primeira cantada coletivamente para valer. Um sutil “Obrigado!” encerrou a parte pré-Substance 1987 (87), inaugurado a partir de Ceremony, e aí o bicho começou a pegar de verdade, corroborando com a declaração do dono da festa: “Agora tudo vai ficar sério!”. E ficou mesmo!
Everything’s Gone Green evidenciou influências eletrônicas, Temptation foi outra com enorme apoio popular e, para a essencial e perfeita Blue Monday, o baterista Paul Kehoe deixou temporariamente seus companheiros, transformando o clássico na primeira não 100% orgânica ao vivo, até para preservar as batidas tão destacadas. Previsivelmente, uma infinidade de celulares foi erguida, gerando desabafos tão sinceros quanto hilários, do tipo: “Abaixa essa porra aí, caralho! Curte o som!”.
Paul Kehoe continuou ausente em Confusion e Thieves Like Us e, nela, uma parcela da platéia posicionada no gargarejo vinha para trás acusando o golpe do cansaço em função do tardar da hora. “Trocando de LP”, pois a compilação é dupla, The Perfect Kiss, mais extensa da noite, trouxe o batera de volta. Sub-Culture veio emendada e, em Shellshock e State Of The Nation, vimos o papel do guitarrista David Potts evoluir para os backing vocals e depois para o de protagonista ao assumir os vocais em Bizarre Love Triangle, emulando a voz de Bernard Sumner no ponto alto parcial da apresentação.
A não menos sensacional True Faith fechou o “ato número um” do espetáculo, discretos agradecimentos tiraram o quinteto do palco e foi um barato observar a reação dos fãs. Um deles, inocente, sem saber de nada, bradou: “Acabou? Tem que ter bis!”. Teria bem além disso! Outro, sóbrio, pontuou: “Quem gosta só de New Order está indo embora”. De fato, rolou uma esvaziada tamanha, talvez para o povo ir ao banheiro, se hidratar ou fumar, que rumamos em direção ao meio da pista com certa facilidade.
Cinco minutos de intervalo, o retorno foi marcado por Trans Euro Express, do Kraftwerk, como intro às 23:28, para renovada convocação do cidadão de outrora: “Senhoras e senhores, Peter Hook & The Light tocando Joy Division”, e quatro pedradas que, se não integraram as dez originais de Substance 1977-1980 (88) no disco, foram incluídas em CD e/ou fita cassete: No Love Lost; Komakino; From Safety To Where…?; e These Days. Quebrando a seqüência, Peter sintetizou: “Disorder”, de Unknown Pleasures (79), reconhecida de imediato e com direito a celulares levantados. Em suma, ela teve o andamento acelerado e virou uma pancada no final, impressionando pela mudança sonora, da vertente eletrônica de uma hora atrás ao pós-punk.
Puxando a compilação, um “Three, five, oh, one, two, five go!” foi a senha para Warsaw, sem o tecladista Martin Rebelski, e de fora ele permaneceu em Leaders Of Men e Digital, regressando em Autosuggestion. Transmission foi identificada e apoiada de bate-pronto, bem cantada, empolgou e veio num crescendo, terminando super aplaudida. E o anfitrião se comunicou antes de She’s Lost Control, porém o microfone estava tão abafado que suas frases foram praticamente ininteligíveis.
Outra de Unknown Pleasures, Shadowplay poderia ser um corpo estranho, entretanto sua conclusão apoteótica se encaixou maravilhosamente e então o conjunto retomou Substance 1977-1980 com Incubation. Não que precisasse fazer média, mas mencionar o saudoso companheiro incendiou geral a galera: “Esta era a música favorita de Ian Curtis. Ian, esta é para você! Deus o abençoe. Descanse em paz!” – Dead Souls. Atmosphere foi dedicada a ele e a seminal saideira Love Will Tear Us Apart foi oferecida a todos os presentes, arrebatando definitivamente a massa!
À 00:48, ouvíamos I Saw The Light, de Hank Williams & The Drifting Cowboys, como outro, enquanto saíamos das dependências pensando: “O que Peter Hook vai inventar para vir ao Brasil novamente?”. Tomara que não demore, pois agradou a todos em cheio! E se você aprecia o trabalho da família Hook nas quatro cordas, o gancho derradeiro, com o perdão do trocadilho, é: Jack Bates, filho de Peter e também baixista, está no The Smashing Pumpkins ocupando o lugar de D’Arcy Wretzky e o grupo tocará no Espaço Unimed em novembro, tão esgotado quanto esteve a Audio para ver seu pai!
Setlist
Peter Hook (vocal e baixo), David Potts (guitarra), Paul Duffy (baixo), Martin Rebelski (teclados) e Paul Kehoe (bateria)
New Order – 1h23’
01) Dreams Never End
02) Procession
03) Cries And Whispers
04) What Do You Want From Me? [Monaco]
Substance 1987 (87)
05) Ceremony
06) Everything’s Gone Green
07) Temptation
08) Blue Monday
09) Confusion
10) Thieves Like Us
11) The Perfect Kiss
12) Sub-Culture
13) Shellshock
14) State Of The Nation
15) Bizarre Love Triangle
16) True Faith
Intervalo – 5’
Joy Division – 1h16’
Intro: Trans Euro Express [Kraftwerk]
17) No Love Lost
18) Komakino
19) From Safety To Where…?
20) These Days
21) Disorder
Substance 1977-1980 (88)
22) Warsaw
23) Leaders Of Men
24) Digital
25) Autosuggestion
26) Transmission
27) She’s Lost Control
28) Shadowplay [do début Unknown Pleasures (79), não da coletânea]
29) Incubation
30) Dead Souls
31) Atmosphere
32) Love Will Tear Us Apart
Outro: I Saw The Light [Hank Williams & The Drifting Cowboys]