Conception — 07/06/2024 — São Paulo

Primeira vinda dos noruegueses a São Paulo supera expectativas apesar do público modesto com boas, porém muitas, bandas de abertura

Texto por Fernando Queiroz e Foto por Amanda Sampaio

Apesar de não ser nenhuma novidade no cenário do Power/Prog Metal, o Conception continuou por muito tempo um “ilustre desconhecido” na cena. Seu nome era, por muito tempo, atrelado ao termo “a antiga banda do vocalista do Kamelot”, o genial Roy Khan. O atrelamento à agora ex-banda de Roy continua, mas agora, com a banda de volta à ativa, e um excelente álbum lançado em 2020 (State Of Deception), a banda já anda com as próprias pernas, e mostrou, ainda que para relativamente pouco público, que merece a atenção de todos que curtem o gênero, e os músicos provaram que a qualidade do time não se resume a Roy Khan. Apesar da grande apresentação, que já deixo claro de antemão que foi, há de se dizer que quatro bandas em um domingo à noite, começando às 19h, em tese, não é nada cômodo ao público, e isso é algo para se repensar.

Antes do Show

O termômetro pré-show, a fila na porta do local, já dava dica: seria uma noite tranquila, nada de local abarrotado. Antes das 18h, horário de abertura, em tese, do Carioca Club na Zona Oeste de São Paulo, um pequeno grupo de pessoas se concentrava na frente do local. A maioria com camisetas do Kamelot, mais que do próprio Conception, que infelizmente tem pouca disponibilidade de merchandising de camisetas, seja oficial ou ‘paralela’, no mercado. Uma pequena fila que, nitidamente, não daria cinco minutos de espera para o último entrar, se o andamento da linha fosse bom. Foi exatamente o caso, e com poucos minutos de atraso, por volta das 18h15 as portas abriram, e logo o ainda baixo público já tinha entrado. Muitas pessoas permaneceram ainda do lado de fora, provavelmente pelo desinteresse em ver tantas bandas de abertura, valendo mais a pena, para eles, beber umas cervejas do lado de fora, que é bem mais barato.

Bandas de abertura

Assim como a abertura da casa, a primeira banda de abertura, prevista para às 19h, demorou mais quinze minutos para entrar no palco. Se não bastasse o horário nada amigável a todos, tudo mostrava que infelizmente sairíamos tarde de lá, um problema para quem depende de transporte coletivo — embora a casa seja localizada bem próxima ao metrô, quem mora longe teria dificuldades com o horário. No mais, três bandas de abertura para uma atração principal que por si só não tem tanta notoriedade não foi a melhor escolha possível, possivelmente desanimando muitos e cansando as pessoas antes do show mais esperado.

Ego Abscence:

Já com oito anos de estrada no cenário underground paulistano, o Ego Abscence foi a primeira banda da noite. Com um layout de palco improvisado, com bateria na

lateral, e um espaço muito pequeno para os músicos — já que o palco da banda principal estava montado —, a banda tentou bastante agitar as ainda poucas pessoas presentes, e fez seu trabalho de forma competente, do jeito que podia, nos diminutos trinta minutos de apresentação que tiveram. Animado, o vocalista Raphael Dantas claramente se recuperando de um problema de saúde, como ele mesmo disse, não estava cem por cento, mas todos ali mostraram competência no que fazem, ótimos músicos que são, e todos, em especial Raphael, tentaram levantar o público presente, não deixando se intimidar por serem a primeira banda, que tocavam com o menor público. Sem espaço para demora, tocaram seu set curto, e se despediram nos quase exatos trinta minutos de apresentação que no fim valeu a pena para quem assistiu, contando até com a participação de uma cantora, momento que talvez foi o mais desnecessário já que a música não combinava com o dueto masculino e feminino, e o que se viu uma banda afiada e com potencial para deslanchar. O ponto negativo fica por conta da muita falação do vocalista Dantas entre as músicas, tempo que poderia ter sido usado para tocar mais uma música, talvez.

Armiferum:

Rapidamente, após a saída da banda anterior, o Armiferum, notória revelação do Power Metal dos últimos anos, entrou no palco. Com um som bem mais rápido e direto que os demais da noite, pedais duplos em todo momento e até mesmo guturais, o sexteto, mesmo com o pouco espaço de palco, se destacou talvez como a melhor das três bandas de abertura, em especial pelo excelente vocalista Ian Gonçalves, que claramente bem tímido em interação com o público já maior que na primeira banda, compensou em carisma e habilidades técnicas com a voz. O tecladista Vithor Moraes, com seu teclado inclinado e um ‘keytar’, mostrou que tecladistas não são apenas membros de fundo de banda, e se colocou perfeitamente no palco, se mexendo e interagindo. Uma apresentação digna e sem dúvidas o público presente assistiu a uma boa amostra do que o iniciante grupo é capaz. Em trinta minutos de show, fizeram seu dever de casa, tocando muito e falando pouco, trouxeram um som mais pesado que o padrão do evento, e isso ajudou, em todos os sentidos, a esquentar mais o clima no Carioca Club. Com apenas um disco lançado, o Armiferum ainda tem muito a mostrar, mas já sabemos que ao vivo dão espetáculo, e valerá a pena ver futuras apresentações mais completas da banda.

Maestrick:

A já veterana banda capitaneada pelo grande vocalista Fabio Caldeira, que recentemente foi presença constante em participações na carreira solo de Edu Falaschi ao vivo, foi a última banda de abertura, já com consideravelmente mais público ao passo que se aproximava o horário da banda principal. Apresentando um som mais lento, um tanto mais leve, e com músicas um tanto mais longas, a competente apresentação só não foi melhor pelo curto tempo de também trinta minutos, que fez com que a banda tocasse poucas músicas e o show parecesse mais rápido ainda do que já foi, mas suficiente para mostrar ao público sua

grandeza e seu porte de banda grande tanto em execução, quanto em apresentação de palco, apesar das limitações de espaço. Caldeira, que não apenas um vocalista, mas também um cantor per se fantástico, foi um show à parte. O que ofuscou um pouco o brilho foi o fato de terem tocado apenas músicas mais recentes, ignorando trabalhos antigos. O destaque fica pelo single recém-lançado Ethereal, uma fantástica música sobre o holocausto.

Conception — a atração principal. Pela primeira vez no Brasil com um velho conhecido do público.

A primeira vez de uma banda no país, para os fãs, é sempre uma incógnita. É verdade que todos sabemos das qualidades dos músicos em questão, e vídeos ao vivo na internet não faltam, porém é diferente estar em um show e ver a coisa acontecer. Por isso, a primeira experiência é imprevisível. Apesar disso, a presença de Roy Khan no Brasil não é nenhuma novidade — ele já veio algumas vezes com o Kamelot, e recentemente participou de um show de Edu Falaschi. Claro, por isso, poderíamos pelo menos saber o que esperar da performance de frontman. Porém, Roy teve muitos problemas de voz ao longo dos anos, e estava parado havia tempo, então poderíamos nos perguntar como ele estaria agora. Spoiler: não decepcionou!

Performance técnica impecável e show de simpatia e presença

Não apenas Khan, mas todos os músicos da banda provaram sem dar margens a dúvidas que são músicos fantásticos. Não apenas tocando seus instrumentos, mas todos com performances de palco sem dar margens a críticas negativas e comparações. A teatralidade e identidade visual da banda, todos com roupas góticas e iluminação em vermelho escuro, deixavam claro a proposta da banda quanto a quais sensações querem passar com sua música, e dada a diferença de sonoridade do último disco em relação aos antigos, sabemos de onde Roy, especialmente trouxe a característica. A proximidade que a banda tinha com o público, de interação e contato direto, era algo incrível, em especial pela parte de Roy e do carismático guitarrista Tobe Ostby. Roy, inclusive, muitas vezes pegava o celular de fãs e filmava do palco a si mesmo e ao próprio público, e educadamente devolvia na mão de cada um o aparelho.

O show

Por volta de 21h30, com cerca de mais quinze minutos de atraso além do inicial, a introdução da banda principal começou a tocar, e logo o Conception estava no palco, tocando a faixa Grand Again, de 2018, e em seus quatro minutos de duração, já se podia perceber o quão afiada a banda estava, e Roy Khan, extremamente ovacionado pelo público, majestosamente entrou no palco e soltou sua voz marcante e única. Os excelentes músicos da banda — Tobe Ostby, Ingar Amlien, Lars Kvistum e Arve Heimdal — entraram extremamente contentes no palco, sorridentes, e animados, com muita energia, provando que não são meros coadjuvantes na banda do membro mais famoso. Havia também uma cantora, Aurora Heimdal, que servia de backing e cantando partes em determinadas músicas

que em estúdio são cantadas por participações especiais, como em The Mansion, que há Elize Ryd do Amaranthe cantando. Aliás, há de se dizer que Ostby é o real membro fundador da banda. A Virtual Lovestory foi a próxima, quando depois Khan saudou o público, agradecendo pelo show, sempre muito simpático e alegre, deixando claro que aquela tinha sido uma turnê especial na América Latina, e aquele, o último show, não seria diferente. Tocaram com a mesma competência Waywardly Broken, No Rewind e The Mansion.

Problemas de microfone foram recorrentes, e o único ponto a ser criticado

Em diversos momentos, especialmente após A Million Gods, o microfone de Khan passou a ter alguns problemas — não problemas de sumir a voz, mas ouvia-se chiados em alguns pontos, e muita microfonia. Umas duas ou três vezes o microfone teve que ser trocado, mas de forma alguma prejudicou a performance, muito menos atrasou as apresentações, foram trocados muito rápido e de forma eficiente.

Parte semi-acústica agrada

Já foi algo popular em shows de metal um pequeno set acústico, mas hoje isso se perdeu. O Conception, porém, trouxe isso para o show, e em Silent Crying e Sundance, Tobe pegou um violão e Arve saiu da bateria para usar uma pequena percussão. Roy sentou em um banco, e tocaram as músicas em formato semi-acústico, com apenas o teclado e o baixo de instrumentos elétricos. Foi um momento descontraído, e foi quando os fãs, uma base de fãs bem barulhenta, cantou a plenos pulmões os refrães.

O show à parte de Tobe Ostby

Após as músicas semi-acústica, tocaram Gethsemane e Parallel Minds, e então foi tocada Feather Moves, uma música que em estúdio tem cerca de seis minutos, mas ela foi estendida por muito mais minutos em um solo de guitarra de Tobe Ostby, que deu um show à parte. Não se resumiu a ficar ali, no palco, tocando e fazendo pose. Tobe desceu do palco, foi para o meio do público com guitarra e tudo, e tirou foto com todos, passou no meio da plateia, subiu nos camarotes — tudo enquanto tocava guitarra sem errar! Se alguém não estivesse apreciando o show, o que era improvável, naquele momento sem sombra de dúvidas foram ganhos!

Conclusão da noite — um show histórico e impressionante, apesar de um público pequeno

By The Blues, Reach Out e She Dragoon seguiram, e então Roy disse que o show estava chegando ao fim. Claro, sabemos que não acabaria ali, e enfim tocaram My Dark Symphony e a derradeira Roll The Fire. Aí sim,o show acabou, deixando os presentes satisfeitos, e impressionados com tamanha qualidade. Não era incomum, em diversos momentos durante e após o show, ouvir pessoas que tinham sido convidadas por bandas de abertura, ou colegas da mídia e fotógrafos, que conheciam pouco a banda, elogiarem o show, elogiarem os músicos, e dizerem que foi uma experiência surpreendente! É uma banda que funcionaria muito bem em

festivais, e tocando em um evento, sabendo dos elogios, seria certeza de conseguirem angariar mais público por aí. Fica uma dica, inclusive, para os organizadores de festivais: é uma banda que adicionaria muito à qualidade do evento!

Conception:

Roy Khan – vocais

Tobe Ostby – guitarra

Ingar Amlien – baixo

Arve Heimdal – bateria

Lars Kvistum – teclados

Aurora Heimdal – backing vocals

Setlist — 09/06/2024:

Grand Again
A Virtual Lovestory
Waywardly Broken
No Rewind
The Mansion
A Million Gods
Quite Alright
Silent Crying
Sundance
Gethsemane
Parallel Minds
Feather Moves
By The Blues
Reach Out
She Dragoon

My Dark Symphony
Roll The Fire

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About Guilmer da Costa Silva

Movido pela raiva ao capital. Todo o poder ao proletariado!

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