C6 Fest 2024: segunda edição é marcada por curadoria requintada e apresentações históricas

Texto e fotos por Melissa Buzzatto

Durante os dias 18 e 19 de março, Sonoridade Underground esteve presente nos espaços Arena Heineken e Tenda MetLife, explorando o melhor do novo e do velho do mundo da música.

O calor do último final de semana veio na medida certa para preparar o público que se deslocou até o Parque Ibirapuera a fim de apreciar uma programação quentíssima de muita música boa.


Nos dias 17, 18 e 19 de março, a capital paulista recebeu a chiquérrima segunda edição do festival C6 Fest, organizado por C6 e patrocinado por Heineken e MetLife, além do investimento do próprio banco.


Para 2024, o C6 Fest manteve sua ótima estratégia de curadoria, ainda que mais fraca se comparada com a primeira edição do evento, que contava com nomes como Underworld, Kraftwerk, Arlo Parks e Samara Joy. Mesmo assim, o festival trouxe atrações que fogem do comum e batido (alô, Rock In Rio), além de trazer nomes consolidados e inéditos, bem como expoentes da nova era do soul, blues, jazz, rock alternativo e pop sofisticado.


Apesar dos grandes acertos de lineup, fica difícil não comentar sobre os necessários ajustes na organização, que devem ser repensados para próximas edições. A localização dos (ótimos) restaurantes, bares e pontos de hidratação é irretocável, por exemplo. Por outro lado, a escolha na distribuição dos palcos incomodou muita gente.


Acontece que, por estarem muito distantes um do outro, a Tenda MetLife e o Espaço Heineken pareciam partes de dois eventos diferentes, descaracterizando consideravelmente a “experiência” de um festival, além de forçar o público a priorizar uma atração ou outra, resultando no esvaziamento de shows poderosos como o de Ayra Starr e Young Fathers. Pior ainda foi o conflito entre os horários de Romy e Raye, shows que atraíram públicos semelhantes, mas, infelizmente, aconteceram simultaneamente.


Abaixo, você confere nossa resenha sobre os shows que embalaram o C6 Fest deste ano:

Sábado, 18 de março

James Brown cubano e a fusão com hip-hop

Cimafunk ficou responsável por inaugurar espaço da Arena Heineken. O músico cubano, indicado ao Grammy 2023, ficou muito conhecido por misturar ritmos do hip-hop e do funk com às características da música cubana.

Para sua primeira apresentação no Brasil, ele contou com a presença de diversos músicos, incluindo saxofonista, baterista, vocais de apoio e outros elementos, intensificando sua presença no palco e fazendo com que, mesmo reduzido, o público presente no show de Cimafunk caísse facilmente em seus encantos.


Música nortista é aclamada com Jaloo + Gaby Amarantos

Enquanto isso, na Tenda Metlife, a audiência recebia a multiartista Jaloo. Como cantora, compositora, DJ e produtora musical, ela tinha muito a entregar no C6 Fest, representando o mix das influências paraenses e música contemporânea mundial.

Além das marcas do Pará, ela também imprime, em suas letras e performances, um pop sem barreiras, repleto de mensagens em defesa da causa LGBTQIA+, reafirmando sua presença vigorosa como mulher trans, pertencente aos espaços de destaque que lhe cabem por tamanho talento que possui.
Em certa parte do show, recebeu Gaby Amarantos, vencedora de Grammy Latino, referência do novo brega brasileiro e igualmente talentosa e forte. Para amantes e curiosos, o fruto dessa parceria foi o mesmo: uma apresentação relevante e comovente.


Afrobeat é com Ayra Starr

A nigeriana Ayra Starr – também indicada ao Grammy, assim como a maioria das atrações do C6 Fest – cantou e encantou com seu afrobeat atual e sedutor na tarde ensolarada de sábado.


Starr, que tem uma colaboração com Anitta para ser lançada em breve, se surpreendeu com o público caloroso que a aguardava na Arena Heineken. Entre ritmos dançantes e funk brasileiro, a cantora demonstrou seu agradecimento aos fãs do país e consagrou-se como um dos grandes destaques do dia.


A vida além do The XX


Nação Tumblr, uni-vos!


Para essa segunda edição de C6, um dos nomes mais comentados foi Romy, membro da The XX, banda de grande renome entre adolescentes e jovens adultos na segunda década dos anos 2000.


O repertório da noite pouco fez menção ao grupo do qual Romy faz parte, abrindo espaço para que o público pudesse degustar e apreciar Mid Air, lançado em setembro de 2023 – e que bom que ela seguiu por esse caminho!


Mesmo tímida, Romy pulava e dançava do seu próprio jeito, tentando acompanhar a empolgação do púbico em resposta ao seu pop sintético e eletrônico. Depois de um setlist bem elaborado, contando com os sucessos Enjoy your life, Lights Out e Angels, única da discografia do The XX, a inglesa deixou os palcos sendo ovacionada pela plateia da Tenda MetLife.


Infelizmente, o show aconteceu simultâneo ao de Raye, grande promessa da música contemporânea, e um dos maiores nomes da curadoria do C6 2024. O ideal seria ter a oportunidade de conferir ambos os shows, mas fica para uma próxima, né?


Farofada dançante de Soft Cell


O melhor show da noite ficou na conta de Soft Cell, grupo pop britânico que esteve no Brasil pela primeira vez para o show do C6 Fest. Porém, da formação original, tivemos apenas Marc Almond, pois Dave Ball, devido aos problemas de saúde que o estorvam há quase dois anos, precisou ser substituído.


O set teve início com Memorabilia, misturada com o refrão de Holiday, da Madonna, e Sex Machine, de James Brown. Uma verdadeira farofada, do jeito que um bom bailão anos 80 deve ser!
Ao longo da apresentação, Soft Cell passeou por seus grandes hits, criando uma espécie de missa arrebatadora, movida por coros dedicados, trabalhos instrumentais de tirar o fôlego e um Marc Almond extasiado por estar em palcos brasileiros dividindo àquele momento único com os fãs fiéis que esperaram tantos anos por essa festança.


Requinte do blues rock com Black Pumas


Com uma Arena lotada, Black Pumas subiu aos palcos para encerrar o sábado de C6 Fest. Formado por Erick Burton (vocal), Adrian Quesada (guitarra) e músicos de apoio, a banda foi a atração mais aclamada da noite. Foi também a que recebeu o público mais diverso do dia, diferente de como foi em 2022, no Lollapalooza, que contava com uma audiência mais jovem.


Com canções fortes como Colors, Fire e até Sugar Man, cover de Sixto Rodriguez, a voz marcante de Burton reverenciou os grandes nomes que influenciaram o Black Pumas, mirando num futuro brilhante que o grupo conquista a cada dia.

Domingo, 19 de maio

A sensibilidade dilacerante de Jair Naves


Nome conhecido na cena independente brasileira por ter sido front da icônica Ludovic na primeira década dos anos 2000, Jair Naves é um daqueles artistas que certamente influenciou pelo menos uma das bandas ou cantores presentes na playlist de qualquer admirador do indie nacional.


Escalado como a única atração brasileira daquele espaço no domingo, assim como foi com Jaloo e Gaby Amarantos no dia anterior, Jair Naves e companhia – Renato Ribeiro na guitarra, Lucas Melo na bateria e Rob Ashtoffen no baixo – entregaram um show nu, cru e emocionante, que já era histórico desde seu anúncio.


Apesar de pequeno em número, o público era grandioso em entrega, condizente com a potência do artista. Sobrava chão na Tenda MetLife por conta do horário (começo da tarde), mas, ainda assim, ela parecia pequena para a densidade poética do repertório escolhido para o show.


Passeando por seus quatro álbuns em carreira solo, Naves dividiu conosco uma virada de página, celebrando sua trajetória e preparando terreno para algo fresco, com outras histórias escritas e cantadas, que hão de vir ainda em 2024, segundo entrevistas concedidas recentemente. Do novo trabalho, a plateia do C6 pode prestigiar o single Névoas, suave e sensível, mas ainda altamente impactante, como tudo que Jair Naves já propôs-se a fazer.


Rock groovado com Squid


Pode parecer batido, mas é difícil não descrever o show do Squid como uma verdadeira experiência.


Nessa mistura que funciona de forma sofisticada e, ao mesmo tempo, eletrizante, em que post-punk serve de base e o céu é o limite, o som da banda inglesa passeia por diversos estilos, e você nunca sabe qual é o próximo ritmo que vai escutar.


Por fim, é seguro afirmar que a apresentação foi um dos grandes destaques e acertos da segunda edição do C6 Fest, atingindo positivamente pessoas de diversas faixas-etárias.


Noah Cyrus faz estreia em palcos brasileiros aclamada por público acolhedor e engajado


O timbre inconfundível e característico das Cyrus brilhou na Tenda MetLife no final da tarde através da voz de Noah, irmã mais nova eterna Hannah Montana.


Em resumo, o show de Noah Cyrus talvez tenha sido uma das maiores surpresas (positivas!) de quem foi para o espaço guardar lugar para os tão aguardados Cat Power e Pavement.


Numa mistura do country que vem de berço – herança de seu pai, o consagrado cantor Billy Ray Cyrus – e pop, a cantora preparou um setlist que atendeu muito bem seus fãs mais antigos, ao mesmo passo em que apresentou, de maneira delicada e coesa, o álbum The Hardest Part (2022), mais maduro e assertivo se comparado aos lançamentos avulsos feitos nos primeiros anos de carreira.


Bob Dylan de 66’ com um toque (ainda mais) especial de Cat Power


Desta vez, a mamãe do indie Chan Marshall, conhecida como Cat Power, retornou ao Brasil para homenagear Bob Dylan e recriar, do seu jeito, cheio de personalidade, a marcante apresentação feita pelo cantor há quase 60 anos, em 1966.


O show em questão é parte da turnê britânica de Bob Dylan, lançado oficialmente em forma de disco somente em 1998, sob o nome The Bootleg Series Vol. 4: Bob Dylan Live 1966 – The ‘Royal Albert Hall’ Concert. O repertório faz parte dos anos de ouro de Dylan, e Cat Power fez questão de seguir a exata ordem de setlist que o cantor adotou para a sua própria apresentação, além de gravar sua própria versão em Cat Power Sings Bob Dylan: The 1966 Royal Albert Hall Concert, de novembro de 2023.


O show é divido em duas partes, simbolizando a transição sonora de Bob Dylan entre folk e rock. Na primeira parte, que precisou ser cortada para caber na programação apertada do C6 Fest, acompanhamos um espetáculo acústico e elegante, com poucos elementos, dando destaque à voz rouca de Cat Power. Já na segunda etapa do show, recebemos uma apresentação mais elétrica e dançante, com auxílio de banda e suas guitarras afiadas.


Canções como Mr. Tambourine Man, The Balad of a Thin Man e Like a Rolling Stone, marcadas na eternidade como sucessos atemporais, arrancaram sorrisos admirados e coros emocionados. Para ser mais preciso, o correto é chamar o que aconteceu no palco da Tenda MetLife de celebração, e uma daquelas feitas da maneira mais especial possível!


Potente e inesquecível, Pavement incendeia tenda MetLife no último dia de C6 Fest


Pessoas de todas as idades e tipos preenchiam o espaço reservado para o tão aguardado show da banda americana Pavement. A apresentação única marcava o retorno do grupo ao Brasil após quase 15 anos de espera.


Rasgado, desleixado e, ainda assim, irretocável: esse é o som de Pavement. Por se tratar de uma banda que marcou a vida de tantos indies da geração passada, a tenda MetLife parecia mais um “encontrão”.


Uma pequena multidão cantava, dançava e gritava, como se honrasse um passado que não volta mais, mas que tratou de deixar boas marcas na pele, na mente e nas cordas vocais. Todo mundo que precisava estar lá, estava. E é isso que fez daquele momento, tão arrebatador.


Malkmus, ao lado de Kannberg, mostrou toda sua desenvoltura na voz e na guitarra, entoando grandes hits dos anos 90. Já Nastanovich, a grande presença líder daquela noite, parecia animado em fazer de tudo um pouco, se divertindo e divertindo seu público, exibindo seus dons na percussão e uma alegria sem igual por estar em palcos brasileiros.


Com um setlist abarrotado de sucessos e sem espaço para bis, Pavement poderia ter tocado por mais uma hora e ainda sobraria espaço e vontade em nossos corações para mais e mais. Para quem marcou presença, fica a sensação de dever cumprido, como se estar lá fosse uma missão, ou até mesmo uma espécie de compromisso, saudando uma banda que moldou não somente o gosto musical de muitos, mas também a forma de encarar a vida como ela é: uma bagunça linda e que vale a pena.


Falando em beleza, fica difícil não fazer menção à belíssima introdução preparada para essa noite especial que honrava Fernanda Azevedo, ativista indie de Belo Horizonte, falecida neste mês de maio. Lindo e emocionante.


Confira o repertório escolhido para a noite de Pavement no C6 Fest:



Por conflito nos horários, não foi possível acompanhar shows tão esperados como Paris Texas, Young Fathers e o maravilhoso Baile do Cassiano, tributo idealizado e organizado por Daniel Ganjaman com o objetivo de celebrar, através das vozes de Liniker, Preta Gil, Negra Li e outros, a obra de Cassiano, renomado compositor e músico brasileiro.


Para encerrar a noite, o público também pode apreciar o romântico e envolvente show de Daniel Ceasar, além das atrações reservadas para o espaço Auditório Ibirapuera, extremamente elogiadas por quem pôde prestigiá-las.


Desencontros à parte, o balanço final é extremamente positivo, deixando uma “pulguinha atrás da orelha” sobre o que é que nos aguarda em futuras edições.


Agradecimentos à Canivello Comunicação e ao C6 Fest pelo credenciamento e parceria em mais um ano de evento!

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About Guilmer da Costa Silva

Movido pela raiva ao capital. Todo o poder ao proletariado!

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