Audição do novo álbum aconteceu no dia 14/09 no Fenda 315
Texto e foto: Gustavo Palma
Agradecimentos: Erick Tedesco & Molho Negro
O ano é 2017. Após um grande período de sucedidos relacionamentos mal-sucedidos, conheço uma Belenense em uma festa no querido Cine Joia, no que hoje me parece uma outra vida. Ambos fãs de música, trocamos diversos links do Spotify durante nossas conversas até que ela me apresenta uma tal banda chamada Molho Negro, da cidade dela. Penso comigo mesmo “Lá vem a bairrista querendo me enfiar banda de amigo goela abaixo” (sim, eu sou 01 chato), mas, após apenas alguns acordes, já sinto que gostarei do que virá a seguir. Quando vejo que o primeiro disco do trio foi lançado em 2012 me surpreendo com o fato de que nunca tinha ouvido falar sobre esses meninos com “pegada Nirvana” que tanto me chamaram a atenção. Enfim, basta de falar sobre o passado e voltemos ao ESTRANHO presente.
Marcando dez anos do lançamento de seu primeiro album homônimo Molho Negro, em uma noite fria e chuvosa característica de São Paulo, eu me encontro no Fenda/Sabot na audição do debute de ESTRANHO. Escutamos por duas vezes o disco completo, chegando em casa eu escutei mais duas vezes e continuo escutando agora, enquanto escrevo essa resenha. Depois de sentir um gostinho do que viria com os singles BERRINI e 23, o disco completo não decepciona e entrega uma jornada brilhante e necessária para os estranhos dias atuais, regada da maturidade e convicção que somente tantos anos na estrada podem proporcionar. Seguindo a linha de Normal, lançado no conturbado 2018, as evidentes e sarcásticas críticas à sociedade (sempre representadas através da persona da banda) que afloraram mais do que nunca em seus últimos trabalhos permanecem afiadas e precisas. O dedo de Gabriel Zander é visível nessa transição para trazer à tona o que sempre esteve no âmago da Molho Negro, aquele soco na boca do estômago que precisamos de vez em quando, mas agora ele vem com um pé na porta. Não é um acidente os nomes das faixas escritos todos em letras maíusculas, é porrada atrás de porrada. Menção honrosa à quarta música do disco, CAMPO EM BRANCO, que me pegou desprevenido apesar de já estar esperando uma surra emocional ao longo da audição. Sorte que estava em público, senão o golpe teria sido fatal. Escutar ESTRANHO numa tacada só é a definição do que hoje significa ser brasileiro. Raiva, medo, tristeza, insegurança e revolta, está tudo ali. É aquilo que sentimos e queremos gritar aos quatro ventos, representados pela voz de João. Logo na faixa número um, o SILÊNCIO pode estranhar, mas rapidamente ele é quebrado por uma nota triste e um pequeno murro de uma guitarra elétrica.
Não é novidade que o período da pandemia nos trouxe reflexão, principalmente aos artistas em geral, mas em Estranho ela vai além de apenas do sentimento catártico do retorno, do sofrimento enfrentado e que, esperamos, ficou pra trás. Aqui, ela está representada no amadurecimento natural dos integrantes e das letras, na musicalidade dos riffs “nirvanescos” (“foda-se o Nirvana…”), nos berros como um pedido de ajuda já que mesmo com tudo que passou ainda não estamos nos movendo na direção correta. Se é que existe alguma.
Ah, e se você está se perguntando o que aconteceu com a minha amiga Belenense, é isso, somos bons amigos até hoje. E eu, continuo um grande fã da Molho Negro.