Entre emoção e virtuosismo: Ben Harper & The Innocent Criminals e Donavon Frankenreiter encantam São Paulo

Além da capital paulista, os californianos — que cultivam uma longa história de carinho com o Brasil — se apresentaram em outras três cidades.

Texto por Carolina Dias e fotos por Giu Pera

Na última terça-feira (15), Ben Harper & The Innocent Criminals se apresentaram no Vibra São Paulo, em show produzido pela Bonus Track. A apresentação fez parte da turnê brasileira, que já havia passado por Curitiba (PR). A turnê no Brasil faz parte da plataforma Mango Sessions, com foco em promover sonoridades diversas e movimentos culturais, criando experiências diferenciadas para os amantes da música e apresenta sua primeira edição de 2025.

A abertura da noite ficou por conta de Donavon Frankenreiter — músico, ex-surfista profissional e parceiro de longa data de Harper, com quem já dividiu colaborações ao longo da carreira. Além de Curitiba e São Paulo, a turnê também incluiu shows em Florianópolis (SC) e no Rio de Janeiro (RJ).

Show de abertura: Donavon Frankenreiter

O show de Donavon Frankenreiter em São Paulo começou com vinte minutos de atraso, abrindo a noite com sua sonoridade suave e envolvente. 

Embora alguns fãs já estivessem posicionados próximos ao palco, o Vibra São Paulo ainda não estava completamente cheio. Era uma típica noite de terça-feira na capital paulista, com clima chuvoso e temperaturas amenas, o que talvez tenha contribuído para a chegada mais lenta do público. Mesmo assim, Donavon conduziu sua apresentação com carisma, aquecendo a atmosfera com sua energia leve e descontraída.

Entre alguns de seus principais hits, como “Move By Yourself”, “It Don’t Matter” e “Free” — esta última em colaboração com o músico Jack Johnson —, Donavon fez uma apresentação envolvente, acompanhado pelo multi-instrumentista Matt Grundy, que assumiu o baixo e gaita, e por Alex Nash na bateria.

O trio mostrou entrosamento e solidez no palco, garantindo ao público uma abertura acolhedora e cativante, que preparou o terreno com sensibilidade e bom humor para a intensidade que viria com Ben Harper & The Innocent Criminals.

Ben Harper & The Innocent Criminals

Logo após a apresentação de Donavon Frankenreiter, foi a vez de Ben Harper & The Innocent Criminals tomarem o palco do Vibra São Paulo. A essa altura, a casa já estava completamente lotada, com o público bem aquecido pelo show de abertura. A energia era contagiante, e a expectativa pelo início da apresentação principal tomava conta do ambiente, criando a atmosfera perfeita para a entrada de Harper e sua banda.

Com um leve atraso, Ben Harper subiu ao palco sozinho às 21h36. Sob luzes ainda discretas, saudou o público e, ao violão, deu início à noite com uma performance intimista de “Waiting On An Angel”. A entrega emocional e a delicadeza da interpretação deixaram muitos na plateia boquiabertos, dando o tom do que estava por vir: uma noite marcada por intensidade, sensibilidade e conexões profundas.

Antes de “Below Sea Level”, é a vez de The Innocent Criminals — banda que acompanha o cantor e compositor desde o início de sua carreira — subir ao palco. Mais uma vez, fica evidente a excelência musical que se poderia esperar para a noite. A canção, que abre o álbum Bloodline Maintenance (2022), é construída sobre uma harmonia vocal suave e melancólica, com claras influências do doo-wop (estilo musical que surgiu nos Estados Unidos nos anos 40 e 50, e ficou muito popular entre grupos vocais afro-americanos), criando uma atmosfera de profundidade e introspecção. Desde os primeiros acordes, fica claro como uma banda de alta técnica e competência eleva o nível de uma grande apresentação.

Logo em seguida, em “Diamonds on the Inside”, Harper faz a segunda— e uma das poucas — interações com o público: cumprimenta novamente e agradece em português, arrancando aplausos calorosos da plateia. Em “Mama ‘s Trippin”, uma das faixas mais pesadas do set, com linhas de guitarra marcantes, a banda entrega uma fusão magistral de elementos do rock, blues e funk. Foi um momento carregado de energia e groove, com o público se soltando e se deixando levar pelo ritmo, que lembra um pouco o Soul dos anos 70. O que se via no Vibra São Paulo era uma plateia hipnotizada pela psicodelia rítmica que essa música transborda. 

Pegando o gancho do tema ‘psicodelia’, em “Faded”, Harper apresenta um snippet — que, na música, é um recorte de uma outra faixa — neste caso, “Fool In The Rain”, do Led Zeppelin. Foi um momento intenso e também a música mais longa do set, com solos de todos os instrumentos e uma homenagem poderosa às lendas do rock. 

Ao final da performance e antes de iniciar “Excuse me Mr.”, Ben Harper fez questão de apresentar individualmente os músicos que o acompanham no palco. A banda The Innocent Criminals é formada por Darwin Johnson no baixo, Alex Painter na guitarra, Chris Joyner nos teclados, Oliver Charles na bateria e Leon Mobley na percussão — um time afiado que ajuda a dar vida à sonoridade única e poderosa de Harper ao vivo.

Em um dos momentos mais intimistas da noite, Ben Harper surge sozinho no palco para apresentar “Walk Away”, acompanhado apenas de seu violão e sob um único feixe de luz. A canção cria uma atmosfera que contrasta com o clima mais leve e despojado das faixas anteriores. Com arranjos puramente acústicos, a melodia simples dá espaço para uma letra profunda, que fala sobre a dor de aceitar que, mesmo havendo amor, às vezes é preciso deixar alguém partir. A interpretação de Harper é contida, mas intensamente emotiva, ampliando o impacto da canção. É uma faixa sincera e profundamente humana.

 Outro momento de forte emoção veio com “Fly One Time”, faixa do álbum “White Lies for Dark Times”, lançado em 2009 por Ben Harper & Relentless7 — banda formada por Harper com o objetivo de explorar uma sonoridade mais crua e voltada ao rock alternativo. O projeto marcou uma mudança significativa em sua trajetória, distanciando-se do estilo mais soul e acústico desenvolvido anteriormente com The Innocent Criminals. A intensidade da música, tanto na letra quanto na execução, reforça essa nova fase: energética, visceral e corajosa.

A noite ainda guardava um momento especial: em “Burn One Down”, Ben Harper convida ao palco a talentosa cantora Céu para dividir os vocais. Antes de chamá-la, ele anuncia com simplicidade — e reverência — que gostaria de trazer “uma amiga que dispensa apresentações”. Céu foi recebida com entusiasmo pelo público e com carinho pela banda. A parceria trouxe um clima de leveza e descontração, revelando um lado mais descontraído de Harper, que, ao longo do show, se manteve geralmente concentrado, sempre entregando interpretações com grande precisão técnica e profunda carga emocional.

Harper aproveita o entusiasmo do público e emenda “Amen Omen” seguido de “Knockin’ on Heaven’s Door” um cover de Bob Dylan. Ao final, se despede, a banda deixa o palco e as luzes se apagam — um encerramento que poderia ser quase perfeito, mas que deixou no ar aquele gostinho de ‘quero mais’. No entanto, a espera durou menos de dois minutos: logo, a banda retorna ao palco para o encore com mais um cover, agora de Marvin Gaye. Ben Harper & The Innocents Criminals performam “Sexual Healing” – cover que não esteve presente na apresentação anterior de Curitiba. 

Após “With My Own Two Hands”, Ben Harper volta a interagir com o público e, com bom humor, admite que seu português ainda não está perfeito. Em seguida, avisa que vai precisar da ajuda de uma fã para a próxima canção — e o público logo entende que se trata de “Boa Sorte/Good Luck”, sucesso lançado em 2007 em parceria com a cantora brasileira Vanessa da Mata. A escolhida para dividir o palco com Harper é a cantora e compositora Sophia Stedile, recebida com entusiasmo.

Antes de iniciar a performance, o músico californiano aproveita o momento para agradecer a Vanessa pela colaboração, reconhecendo a força e o carinho que envolvem essa canção até hoje. O Vibra São Paulo pareceu vibrar junto com a empolgação do público — afinal, “Boa Sorte/Good Luck” tem trechos em português e é sempre um dos momentos mais aguardados pelos fãs, que aproveitam para cantar em coro e soltar a voz com entusiasmo. E Sophia representou muito bem. 

Para encerrar de vez uma noite memorável, a banda se retira do palco mais uma vez, deixando Ben Harper sozinho sob os holofotes. Assim como no início do show, ele escolhe um momento intimista para a despedida, apresentando “Another Lonely Day” apenas com voz e violão. A simplicidade da cena amplifica a força emocional da canção — e o público, em reverência, parecia nem piscar, totalmente presente no momento. Ao final, Harper agradece com carinho pela presença e energia dos fãs, que, em retribuição, entoam em coro: “Harper, Harper, Harper”.

A apresentação de Ben Harper & The Innocent Criminals foi mais do que um simples show — foi uma experiência emocional, sensorial e musical que passeou com naturalidade entre o íntimo e o explosivo. Com uma banda afiada, participações especiais e um repertório que equilibra potência e delicadeza, Harper demonstrou mais uma vez porque segue sendo uma das vozes mais autênticas da música contemporânea. Ao unir técnica, sentimento e conexão com o público, entregou uma noite inesquecível, marcada não só por grandes canções, mas por momentos que permanecerão ecoando na memória de quem esteve ali.

Ben Harper & The Innocent Criminals – Vibra São Paulo- 15/04/2025

  1. Waiting On An Angel
  2. Below Sea Level
  3. Say You Will
  4. Diamonds on the Inside
  5. Burn to Shine
  6. Don’t Take That Attitude to Your Grave
  7. Mama’s Trippin’
  8. Faded | Fool In The Rain | Faded (Led Zeppelin cover)
  9. Excuse Me Mr.
  10. Walk Away
  11. Forever
  12. Steal My Kisses / Need to Know Basis
  13. Fly One Time (Ben Harper & Relentless7 cover)
  14. Burn One Down (Feat. Céu)
  15. Amen Omen / Knockin’ on Heaven’s Door (Bob Dylan cover)

ENCORE:

  1. Sexual Healing (Marvin Gaye cover)
  2. With My Own Two Hands
  3. Boa Sorte / Good Luck (Feat. Sophia Stedille – fã convidada ao palco) (Canção de Ben Harper & Vanessa da Mata)
  4. Another Lonely Day
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